Plantações Florestais na Paisagem é tema de encontro do Diálogo Florestal

21 mar, 2018 | Diálogo Florestal, Notícias

O Diálogo Florestal Internacional (The Forest Dialogue – TFD), em conjunto com o Diálogo Florestal Brasileiro e a plataforma Nova Geração de Plantações (New Generation Plantation – NGP/WWF), realizou no Brasil, um diálogo de campo sobre Plantações Florestais na Paisagem (Tree Plantations in Landscape – TPL). O evento ocorreu de 12 a 16 de março, na região do extremo sul da Bahia e norte do Espírito Santo, com a presença de mais de 50 representantes de empresas, ONGs ambientalistas e sociais, academia e governo de mais de 10 países.

Atualmente o cultivo de árvores representa apenas 7% da área florestal mundial e fornece um terço da madeira industrial do mundo, proporção que deve aumentar expressivamente nas próximas décadas. É conhecido seu potencial para a prestação de serviços ambientais e para a geração de benefícios sociais, a exemplo do combate às mudanças climáticas e aos esforços de conservação. No entanto, diversos aspectos das plantações florestais mundiais ainda são controversos, e geram custos ambientais e sociais correlatos que podem superar os benefícios gerados.

A iniciativa “TPL” visa explorar a evolução das questões acerca das plantações de árvores no contexto integrado da paisagem, ao envolver as principais partes interessadas a nível internacional, nacional e local; e ao mostrar em campo cases de sucesso e desafiadores.

A iniciativa foi lançada em setembro de 2015, pelo The Forests Dialogue (TFD) durante o XIV Congresso Mundial Florestal, na África do Sul; e o primeiro diálogo de campo foi realizado no Chile, em 2016. A Iniciativa TPL no Brasil se baseou nos resultados da primeira reunião do TFD sobre Silvicultura com Manejo Intensivo (Intensively Managed Planted Forests – IMPF), realizada em 2008, a qual identificou medidas ambientais e sociais prioritárias.

A TPL no Brasil visou revisitar estas medidas para avaliar seu nível de desenvolvimento e implementação efetiva; e propor soluções para os próximos 10 anos, por meio da troca de experiências entre os participantes do diálogo.

 

A seguir compartilhamos uma edição especial feita pela Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ), sobre as visitas realizadas e os pontos prioritários do debate.

Abertura

O Diálogo foi iniciado com uma visita a área da estação ecológica da Veracel, onde Luís Neves Silva, coordenador do NGP Internacional, e Gary Dunning, secretário executivo do TFD, apresentaram as respectivas plataformas, um histórico da discussão sobre as plantações florestais no mundo e as expectativas para a semana de visitas e diálogo.

O presidente da Veracel, Andreas Birmoser, participou da abertura e destacou a importância do histórico do diálogo na região e desta ferramenta como processo de construção conjunta. E reiterou a necessidade de que o diálogo possa trazer soluções e ações concretas para o desenvolvimento da atividade no campo.

Áreas de Conservação – RPPN

A Estação Veracel é uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) e se soma a outras seis Áreas de Alto Valor de Conservação da empresa, que correspondem a quase 10 mil hectares (ha). O Plano de Plano de Manejo (PM) da RPPN, revisado no último ano, foi o primeiro no Brasil a incorporar a visão de mudanças climáticas.

Algumas comunidades e fazendas habitam o entorno da área e diversos cuidados são tomados para prover renda e disponibilidade de água, entre outras necessidades, às partes interessadas. Parte da RPPN é caracterizada por vegetação “mussununga”, com solo arenoso exclusivo da região.

A área possui monitoramento de fauna e flora e a equipe vai sempre a campo para verificação. A biodiversidade local é rica, podendo chegar a mais de 300 espécies de árvores em um único hectare. São encontradas importantes espécies de fauna como mutum, jaguatirica, bugio, harpia e onça pintada.

O principal desafio enfrentado pela companhia é a caça ilegal. Uma das grandes vantagens de manter este tipo de reserva nas mãos das empresas é a dedicação. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) estima que se tenha um colaborador para uma área de 50 mil m² de Unidades de Conservação Federal, enquanto os 10 mil ha da empresa possuem 18 pessoas envolvidas nas atividades ligadas a gestão da área.

A trilha recebe diversos visitantes e está prevista a implementação de uma trilha inclusiva para que a natureza possa ser percebida e valorizada cada vez mais pela sociedade.

A visita visou mostrar áreas de conservação do setor que vão além dos requisitos legais e demandam significativos investimentos. A apresentação dos programas na RPPN, bem como a implementação de corredores ecológicos foram apontados pelos participantes do evento como um progresso notório desde o início do diálogo na região.

Fomento e Restauração

Em visita à fazenda de um fomentado da empresa Veracel, na região de Porto Seguro, os participantes tiveram a oportunidade de entender o modelo de parcerias florestais entre as empresas e produtores. Entre os pontos que chamaram a atenção do grupo, estão os detalhes do contrato de fomento, em especial da formação de preço da madeira.

O processo de certificação também foi destaque na visita: os fomentados da empresa na região passam por um processo de certificação coletiva, que conta com o apoio da empresa, de consultorias, como a 2Tree, e de entidades, como  a Associação dos Produtores de Eucalipto do Extremo Sul da Bahia (Aspex). O produtor reforçou a importância do apoio da empresa para conseguir a certificação, que seria economicamente inviável de forma independente.

Projeto Assentamentos Agroecológicos

Realizadas visitas a duas áreas pertencentes ao Projeto Assentamentos Agroecológicos, fruto da parceria entre a empresa Fibria e o Movimento dos Sem Terra (MST), na região de Teixeira de Freitas, na Bahia. Foi um momento importante em que os visitantes puderam notar em campo o valor dos processos de diálogo.

Na área visitada, ocupada há 1 ano e 3 meses, cada família possui 10 hectares de área produtiva, em que são realizados plantios integrados como pimenta, banana, coco, mandioca e morango, entre outros.

O assentamento conta com uma escola popular, com um corpo técnico formado por pedagogos e agrônomos, e cujo objetivo é formar a consciência de agroecologia das famílias de assentados. É da escola que saem as principais experiências que serão aplicadas nas áreas produtivas das famílias.

Em apresentações dos coordenadores do projeto do MST para essa área, foi destacado o histórico de conflito com as empresas na região, os principais resultados desta parceria e os desafios que ainda são enfrentados pelos assentamentos, como a ausência de políticas públicas. O coordenador do MST reiterou ao grupo o importante papel das empresas na resolução do parcelamento da terra, de forma que as famílias possam ali se estruturar. Notória tambem a relevância das parcerias entre universidades e estas comunidades, que auxiliam na assistência técnica e no planejamento das propriedades e produção.

Restauração de Áreas

Em visita a áreas de restauração da Suzano foram abordadas as exigências e políticas de uso da terra – federais e estaduais – que demandam a recuperação de áreas, apontadas as dificuldades para o ganho de escala da recuperação, e a importância de parcerias com viveiros locais e institutos de pesquisa para a definição de espécies e modelos a serem implementados.

Além do custo dos processos de enriquecimento e implantação de áreas de florestas nativas, houve grande discussão sobre a necessidade de controle químico de pragas e doenças em áreas de Reserva Legal (RL). Apesar de reconhecerem os esforços do projeto de restauração, ONGs e empresas estrangeiras participantes do diálogo levantaram inúmeras questões quanto ao uso de defensivos químicos.

As ONGs questionaram sobre o impacto ambiental e social das plantações na paisagem (principalmente solo e cursos d’água) e na saúde humana. A empresa defendeu a necessidade contínua de estudos – há alguns ainda inconclusivos – e reiterou seus esforços em pesquisa e estudos para monitorar e mitigar eventuais impactos do uso de defensivos.

Apontados estudos recentes que indicam que estes produtos, na dosagem aplicada no setor, não atingem o lençol freático (não ultrapassam mais que 25 cm do solo). Reiterado que não é possível identificar a origem de alguns dos efeitos – plantio florestal vs cultura agrícola vizinha; e apresentadas as práticas de manejo adotadas para mitigar impactos sociais e ambientais, tanto nos plantios comerciais quanto nas áreas de restauração.

Foi um momento fundamental para a avaliação dos desafios de dar escala aos projetos de restauração no Brasil.

Comunidades tradicionais

No último dia de campo, os participantes visitaram alguns casos de sucesso de programas de relacionamento com as comunidades tradicionais da Fibria: duas comunidades quilombolas e uma aldeia indígena, no Sul da Bahia e no Espírito Santo. Por meio do Programa de Desenvolvimento Rural Territorial, a empresa atua na busca pelo desenvolvimento de fontes de renda e garantia de alimentação e autossuficiência das comunidades.

Nas comunidades quilombolas, o grupo questionou a atuação do estado, principalmente nas questões de saúde e de água, e a existência de espaço para as empresas preencherem essa lacuna governamental. Outros pontos que chamaram atenção dos participantes foram a demanda por geração de emprego, ao mesmo tempo em que se quer assegurar a manutenção das novas gerações aderentes a cultura da comunidade e fixadas na região.

Apresentado também o relacionamento da empresa com as comunidades indígenas da região de Aracruz (ES): desde a demarcação do território pelo governo brasileiro, há 10 anos, abriu-se espaço para diálogo, cessando o pior momento do conflito. Além da demarcação de terras, outro grande benefício foi a certificação, que incentivou o desenvolvimento de um bom relacionamento entre indígenas e empresas. Considerado notável o trabalho das mulheres nas tribos, responsáveis pela confecção e inovação na comercialização de artesanatos.

Observou-se que tais fatores podem ter criado um ambiente favorável, pois houve aumento significativo da população que habita a comunidade. No entanto, as lideranças indígenas reiteraram que ainda existem disputas, mas que a demarcação foi uma grande conquista.

No aspecto ambiental, foi reiterado que as empresas auxiliam no processo de recuperação das áreas, o que permite o retorno da fauna, mesmo em locais próximos aos centros urbanos. Porém, as lideranças indígenas enfatizaram que nem toda a biodiversidade foi recuperada. Ainda são necessários avanços na conexão da paisagem, hoje fragmentada, com importante papel do planejamento da mesma, para melhor uso da terra e recuperação da vegetação natural.

Os participantes reconheceram que a relação das empresas com as comunidades indígenas foi a maior mudança dos últimos 10 anos, desde a última visita do diálogo a região.

Temas prioritários

Os temas considerados prioritários para o desenvolvimento de ações e diálogo no Encontro do TPL no Brasil incluem:

  • Novos modelos de plantações, considerando intensificação sustentável e mudanças climáticas;
  • Engajamento de outros setores produtivos e governo, pensando em modelos de governança;
  • Justiça social na escala da paisagem, considerando aspectos culturais e promoção da autonomia;
  • Novos modelos de restauração florestal, considerando aumento da abrangência;
  • Diversificação na escala da paisagem, com foco em uso da terra, espécies cultivadas e produtos gerados;
  • Plataformas neutras de diálogo, com participação equitativa e equilibrada;
  • Monitoramento e reporte dos resultados alcançados, contemplando aspectos ambientais, sociais e econômicos.

Soluções potenciais e agenda futura

Após os momentos de diálogo e discussões em grupo dos desafios quanto aos temas prioritários, foram apresentadas potenciais soluções para a implementação de ações. O TFD, o NGP e seus membros têm um papel relevante nesta agenda e as soluções propostas serão tema para os futuros diálogos e projetos destas plataformas. Algumas das soluções apontadas nas discussões incluem:

  • O aprimoramento da comunicação sobre o conceito de intensificação sustentável, considerando os esforços já realizados para reduzir consumo e uso de recursos por parte das empresas, e não negligenciando a crescente demanda por produtos de base florestal;
  • A discussão do papel da intensificação sustentável na conservação, restauração e gestão da paisagem, trazendo para o diálogo os benefícios ambientais e sociais (incluindo geração de empregos, transferência de tecnologias, etc) associados a este modelo de produção e uso de tecnologias;
  • Desenvolvimento de ferramentas de monitoramento para a avaliação da performance de modelos de produção baseados em intensificação sustentável; e também do sucesso e da qualidade das áreas restauradas, incluindo qualidade e disponibilidade da água, aumento da biodiversidade e uso de defensivos;
  • Investimento em pesquisa e desenvolvimento para que se tenha evidências para modelos de produção sustentável e para modelos de restauração;
  • Engajamento de diversos níveis de governo para o estabelecimento de políticas que possibilitem a restauração em escala, a geração de benefícios sociais e o estabelecimento de baselines e metodologias de contabilidade, que permitam o entendimento sobre o papel das florestas na mitigação das mudanças climáticas;
  • Incentivar e expandir modelos de fóruns multistakeholder, a exemplo dos comitês de bacias, que possam discutir modelos e mecanismos criativos para garantir financiamento para os projetos de restauração e seus benefícios associados (biodiversidade, água, estoque de carbono, etc);
  • Engajamento e mobilização de outros setores de uso da terra para a proposição de soluções e ações que considerem a gestão da paisagem;
  • Articulação e engajamento de lideranças comunitárias para garantia de participação nas tomadas de decisão na gestão da paisagem;
  • Dar visibilidade para essa necessidade de promoção de justiça social e atuar junto à sociedade para politicas públicas que priorizem a educação.

Ressalta-se o reconhecimento pelos participantes do diálogo, da evolução das condições ambientais, relacionamento com comunidades e interação dos produtores na cadeia de produção florestal da região.

O próximo encontro do TPL foi anunciado e deve acontecer em outubro, na Nova Zelândia.

Autora: Miriam Prochnow.
Pontos em destaque: Indústria Brasileira de Árvores – IBÁ.

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